segunda-feira, 25 de junho de 2007

Dados indicam que devastação não traz desenvolvimento

Abertura do Seminário da Agricultura Familiar coloca em discussão modelo de desenvolvimento de Mato Grosso

A necessidade de colocar o modelo de desenvolvimento adotado até agora em Mato Grosso na pauta de discussão das instituições públicas, sociedade civil e movimentos sociais é um dos principais recados do Seminário da Agricultura Familiar do Norte de Mato Grosso. Isto porque mesmo com o expressivo crescimento da produção agrícola do Estado, as riquezas produzidas não têm chegado aos pequenos agricultores e agricultoras.

Na palestra da manhã desta segunda-feira, 24, no Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Lucas do Rio Verde, Alexandre Olival mostrou uma série de dados estatísticos dos últimos 15 anos, como o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), variação de renda, concentração das propriedades, desmatamento e produção econômica nos municípios abrangidos pela Rede BR163+Xingu.

Coordenador do projeto PDA/Padeq de Carlinda e técnico do Instituto Ouro Verde, Olival relacionou dados sobre desmatamento e queimadas em nove municípios onde há projetos da Rede, com indicadores sociais e econômicos. Juntos, os nove municípios respondem por 9% dos focos de queimadas de Mato Grosso no período entre 2000 e 2006, e metade deles já tem pelo menos metade de sua área total desmatada.

No entanto, o uso intensivo dos recursos naturais não significa melhora na qualidade de vida da população, especialmente dos pequenos agricultores. Em municípios onde a fronteira do desmatamento é mais antiga como Nova Guarita, com quase 80% de sua extensão territorial desmatada, a renda média da população, segundo o IDH, cresceu menos de 10% em 10 anos.

No outro extremo, municípios onde a expansão agrícola e o desmatamento são mais recentes, caso de Vera, Nova Ubiratã e Novo Mundo, onde há um número maior de focos de queimadas e desmatamento, há queda na renda média da população e aumento significativo do número de indigentes nos últimos anos.

Na avaliação de Olival, a reflexão que os dados indicam é que, se a agricultura familiar repetir o que vem sendo a proposta de desenvolvimento de Mato Grosso nas duas últimas décadas, o cenário de pobreza e degradação dificilmente vai se modificar. E a saída para esse problema também não pode ser uma simples maquiagem ecológica.

"Temos que perceber que é preciso mais do que parar de usar veneno e plantar árvores, precisamos de outro modelo de desenvolvimento, de alternativas reais de desenvolvimento para a agricultura familiar que contemples todas as dimensões da sustentabilidade, que incluem aspectos econômicos, políticos, culturais, ambientais e muitos outros.", ressalta Alexandre Olival.

Rede BR163+Xingu

É justamente nesse sentido que caminham os projetos da Rede BR163+Xingu, que reúne projetos de conservação socioambiental no eixo da rodovia BR-163 e na Bacia do Rio Xingu. Todos os projetos, apoiados pelo PDA/Padeq do Ministério do Meio Ambiente, buscam alternativas econômicas sustentáveis para agricultores e agricultoras familiares, desde a recuperação de pastagens e áreas degradadas, até agroextrativismo, apicultura e outras atividades produtivas.

Entre os participantes da rede, a avaliação de que é preciso rever o modelo de desenvolvimento que está posto. "Nós precisamos produzir, mas com responsabilidade socioambiental", afirma Paulo Sérgio Araújo, vice-prefeito do município de Vera, onde é desenvolvido um projeto no Assentamento Califórnia.

Comercialização

Nilfo Wandscheer, presidente do STR de Lucas do Rio Verde e coordenador da Rede BR163+Xingu coloca outro ponto na discussão: a necessidade de se ter, além de alternativas de produção para agricultores e agricultoras familiares, uma rede estável de comercialização. Nilfo lembra que a venda individual da produção dos pequenos sítios, mesmo no comércio local, é difícil.

Os mercados exigem regularidade na entrega de produtos e somente a união de grupos de pequenos produtores pode garantir a escala necessária para manter espaços de venda regulares. "Além disso, precisamos começar a puxar a linha do consumo consciente, ou seja, colocar na rotina das pessoas saber de onde vem o que elas estão consumindo e valorizar aquilo que é produzido pela agricultura familiar".

É nesse sentido que a organização do Seminário também organizou a Feira Saberes e Sabores, que acontece até amanhã, terça-feira (25), em frente ao STR de Lucas do Rio Verde. Um espaço para mostrar e vender a produção de agricultores e agricultoras do eixo da BR-163 e Bacia do Xingu, envolvidos em iniciativas de alternativas de produção econômica e ecológica. Os eventos fazem parte da Campanha Y Ikatu Xingu.

Gisele Neuls
Estação Vida

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